Deserto VerdeLagoa seca pela monocultura de eucalipto renasce no Território Quilombola

Fernanda Couzemenco
Existe vida em meio ao deserto verde da monocultura de eucaliptos, no norte do Espírito Santo. Vida real, resiliente e próspera, e que não consta na onerosa publicidade ou nos relatórios de (in)sustentabilidade das papeleiras multinacionais Aracruz Celulose (Fibria) e Suzano Papel e Celulose.

Vida que brota das mãos das pessoas que se dedicam a plantar água no Território Quilombola Tradicional do Sapê do Norte, entre Conceição da Barra e São Mateus. Vida que ressurge a cada eucaliptal substituído por agroflorestas, a cada nascente protegida, a cada metro quadrado de Áreas de Preservação Permanente (APPs) reflorestado, a cada lavoura de alimentos saudáveis que é erguida.

 

Do trabalho com a terra, floresce também tradições culturais e novas formas de interagir com a sociedade não-quilombola e com a terra secularmente habitada pelos antepassados, com as quais a identificação e interdependência é mais que emocional, é orgânica.

Há cerca de cinco anos, os moradores da comunidade quilombola do Angelim 1, em Conceição da Barra, se dedicam intensamente à restauração de um complexo de lagoas que desapareceram ao longo de mais de 40 anos de monocultura de eucaliptos.

A lagoa do Murici, localizada numa área de Retoma – áreas que compõem o Território Quilombola, mas que ainda estão ocupadas pelo deserto verde, sendo então resgatas pelas comunidades tradicionais – nas proximidades do Angelim 1, foi a primeira das três lagoas a dar sinais de vitalidade.

“As atividades favoráveis ao aparecimento da agua continuarão por aqui”, afirma o técnico em agropecuária e agroecologista João Batista Guimarães, o João do Angelim, referindo-se basicamente ao Sistemas Agroflorestais (SAFs) voltados ao plantio de água na região, a partir dos conhecimentos adquiridos em diversos seminários, oficinas e atividades desenvolvidas junto a variadas entidades e organizações que apoiam a luta quilombola por seu território tradicional, como igrejas, o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

“São vários pontos, várias ações integradas, vários grupos experimentando a ideia de plantar água”, conta. “Estamos numa situação complicadíssima com água potável, água do rio mesmo”, diz João do Angelim.

No futuro, a ação agroflorestal deve se somar a projetos turísticos, aproveitando a visibilidade da comunidade vizinha, a Vila de Itaúnas. vizinha. “Vamos trabalhar o agroturismo”, anuncia.

SECULO DIARIO - BRASIL - 04 junio 2018